domingo, 15 de junho de 2008

Columbano e Eça de Queirós



Pintura de Columbano Bordalo Pinheiro, Retrato de Eça de Queirós.
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Ainda decorria o ano de 1895, quando Eça de Queirós endereçou uma carta a Columbano, pretendendo ir com Alberto de Oliveira ao atelier do pintor, para pedir um arranjo na capa d' O Serão. Este magazine seria para dar continuidade à Revista de Portugal, discutindo-se a sua edição entre 1894 e 1895. Eça ficaria como director e Oliveira como secretário, sendo a capa em «originaes linhas e cores, do pincel do grande pintor Columbano». A este propósito Eça escreveu uma carta, onde se notava, no meio de censuras, forte apreço pelo artista. A aguarela que Columbano apresentara não fora bem aceite. O desenho era para a capa e o escritor considerava que ela deveria atrair e reter o «olho» do grosso do público, que «ama as coisas claras, nítidas e bem arrumadas. Ora sobre a mesa há um desalinho elegante e estético, que ao nosso bom Público pareceria trapalhada, e que lhe faria supor que no magazzine as ideias andariam assim a trouxe-mouxe (...). A nossa situação é dolorosa: como artistas, só queremos uma capa desenhada por um grande artista: e como industriais, necessitamos um desenho adequado ao grosso Público». E continuava afirmando que queria «uma capinha com (...) tudo mais arranjadinho como convém a um serão de boa paz». Projectava-se o primeiro número da revista para Janeiro de 1896, mas esta nunca veio a ser publicada.
Mais importante que a aguarela, foi o retrato de Eça de Queirós que se perdeu após a exposição de Paris. Além da qualidade da obra, testemunhada pela maioria daqueles que a puderam observar, o retrato perdido adquiria ainda uma outra dimensão trágica, pois Eça faleceu no Verão de 1900, tendo essa fúnebre notícia causado grande impressão no artista. Fora por influência do Conde de Arnoso que ele conseguira pintar o retrato do escritor. Comovido, dizia que esse «retrato que fiz, embora pouco valha como Arte, foi pintado diante d’elle, (...) portanto, tem ainda pedaços da sua vida, foi sentido do natural. Tem por isso o valor de um documento (...). Desejava eu muito offerecel-o ao meu querido amigo, que é quem mais lhe poderá dar o valor, como uma pobre e triste recordação d’esse seu tão grande amigo, e também recordação de tudo que se passou n’essa epocha, em que elle esteve entre nós».
Escritor e artista ficavam ligados através desse retrato. No Ocidente, João da Câmara lembrava que esta obra fora muito notada na exposição de Paris e justamente havia concorrido para a medalha de ouro que o pintor recebeu. «Columbano, profundo psychologo tambem, e que, em bem diversa arte, tem entretanto muitos pontos de contacto com o retratado, fez uma obra maravilhosa, e conseguiu com o seu pincel, copiando feições, descrever mais fielmente todas as grandes e complicadas faculdades do alto espirito que, fugindo nos enlutou, do que hão de fazel-o volumes a escrever, de mais grosso tomo que toda a obra do escritor». E também acrescentava que «Chamando a atenção para essa obra de Columbano, cumprimos um dever, porque talvez poucos artistas hajam tão evidentemente comprehendido como o insigne pintor (...) a alma artistica do homem de letras (...). Não é apenas um retrato que fala; é um retrato que diz: sou eu. / Depois... um retrato bom sempre é consolação para os que ficam».
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Texto de Margarida Elias.

4 comentários:

Miguel disse...

Posso perguntar-lhe qual é a fonte da imagem do quadro de Columbano?

Obrigado.

Margarida Elias disse...

A fonte da imagem não me recordo de repente qual é, mas posso procurar. Depois digo. Seja como for, tenho quase a certeza que esta pintura foi publicada no livro de Diogo de Macedo, sobre Columbano.

Miguel disse...

Obrigado. É bom saber que pelo menos sobrevive em imagem, já que o original se perdeu.

Gostei bastante das mãos do Eça.

Rita Roquette de Vasconcellos disse...

que belo texto