domingo, 10 de julho de 2011

Sobre a gestão das actividades diárias e as histórias infantis

Scott Gustafson, Cinderella and the Birds
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Verdade seja dita que a história da Cinderela é muitas vezes visualizada cá em casa, sobretudo na forma do filme da Disney e em versão brasileira. De toda a história, o que eu acho mais graça é à canção dos ratinhos, a protestar contra as actividades incessantes da Cinderela, escravizada pela madrasta e pelas suas filhas:

Não querendo minimamente entrar em discussões feministas sobre a divisão do trabalho, na verdade por vezes sinto-me demasiado cheia de actividades, o que por sua vez me faz lembrar esta história que descobri quando estive a dar aulas de Língua Portuguesa ao 5.º ano:

Era uma vez uma mulher casada, mas que se dava muito mal com o marido, porque não trabalhava nem tinha ordem no governo da casa.
Começava uma coisa e logo passava para outra, tudo ficava a meio, de forma que quando o marido voltava para casa à noite nem tinha o jantar feito, nem água para os pés, nem a cama feita.
As coisas foram andando assim, até que o homem lhe começou a bater, e ela a passar muito má vida. A mulher andava triste por o homem lhe bater, e tinha uma vizinha a quem se foi queixar, a qual era velha e se dizia que as fadas a ajudavam. Chamavam-lhe a Tia Verde-Água.
– Ai, tia! Vocemecê é que me podia valer nesta aflição!
– Pois sim, filha. Eu tenho dez anõezinhos muito trabalhadores, e mando-tos para tua casa para te ajudarem...

A velha começou a explicar-lhe o que devia fazer para que os dez anõezinhos a ajudassem: que quando pela manhã se levantasse fizesse logo a cama, em seguida acendesse o lume, depois enchesse o cântaro de água, varresse a casa, arranjasse a roupa, e no intervalo em que cozinhasse o jantar fosse dobando as suas meadas, até o marido chegar.
Foi-lhe assim indicando o que havia de fazer, que em tudo isto seria ajudada sem ela o sentir pelos dez anõezinhos. A mulher assim fez, e se bem o fez melhor lhe saiu.

Foram-se assim passando os dias, e o marido estava tão pasmado por ver a mulher tornar-se tão arranjada e limpa que lhe disse que assim viveriam como Deus com os anjos.
A mulher contente por se ver agora feliz, foi a casa da Tia Verde-Água agradecer-lhe o favor que lhe fez.
– Ai, minha Tia, os seus dez anõezinhos fizeram-me um grande serviço! Trago agora tudo arranjado, e o meu homem anda muito meu amigo. O que lhe eu pedia agora é que mos deixasse lá ficar.
A velha respondeu-lhe:
– Deixo, deixo. Pois tu ainda não viste os dez anõezinhos?
– Ainda não; o que eu queria era vê-los.
– Não sejas tola; se tu queres vê-los olha para as tuas mãos. Os teus dedos é que são os dez anõezinhos.
A mulher compreendeu o que tinha acontecido, e foi para casa satisfeita consigo mesma por ter aprendido a ter gosto pelo seu trabalho.
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Bem vistas as coisas, tanto a história da Cinderela como a dos Dez anõezinhos são discutíveis do ponto de vista da igualdade entre os sexos e da defesa dos direitos humanos, mas na verdade há duas boas lições a tirar delas: nunca perder a esperança e tentarmos ser mais organizados de maneira a conseguir fazer bem o que temos para fazer.

4 comentários:

ana disse...

Oh Margarida, que fantástico todo este post.
Primeiro, as histórias de infância e a da Tia-Verde que não conhecia.
Segundo, a conclusão que delas retirou.
Preciso de sete anõezinhos...

Soube-me muito bem ler esta postagem e vai ser um ponto de referência deste presente para o futuro.
Bjs e obrigada! :)

Margarida Elias disse...

Obrigada Ana! Eu também preciso... Bj!!

Presépio no Canal disse...

Lembro-me muito bem desta historia! :-) Foi assim que a minha avo comecou a ensinar-me como organizar-me nos estudos e a cuidar do meu quarto. Cheguei a ter o livrinho! Talvez o encontre novamente nas livrarias quando ai for!
Bom recordar! :-)
Bjs!

Margarida Elias disse...

Sandra: É uma história bem engraçada. bj!