Columbano Bordalo Pinheiro, Retrato de Alda Lino (1910).
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Columbano Bordalo Pinheiro nasceu a 21 de Novembro de 1857 e Raul Lino nasceu no mesmo dia, mas em 1879. Eram amigos pelo menos desde 1907, quando o pintor realizou um retrato do arquitecto. Em 1910, Columbano fez o retrato de Alda Decken Lino, que era uma mulher destacada da sociedade, «figurinha de madona, de bandós negros e olhos transparentes» (Raul Brandão). A ideia de Columbano era representar uma mulher bonita, cujo retrato sobressaísse numa exposição em Paris: «Comecei um retrato da Senhora do Lino, em vestido de baile, todo branco e oiro. Espero tirar delle algum partido. Veremos».
No Retrato de Alda Lino, composto com pinceladas livres e em tonalidades claras, há uma movimentação expressiva que recria uma impressão de espontaneidade. Patenteando a elegância da retratada, ela segura um leque na mão esquerda. O seu corpo está também virado para a esquerda, mas a cabeça olha no sentido contrário, como se algo lhe tivesse chamado a atenção. Este movimento do corpo cria uma tensão, que contrasta com a chávena de chá, o livro e o candeeiro sobre a mesa, associados aos momentos de tranquilidade. Junto dessa chávena vemos uma escultura reproduzindo a Vitória de Samotrácia, a qual, sendo uma imagem alada e virada no sentido contrário ao do olhar de Alda Lino, acrescenta outra nota de instabilidade à composição. A sensação geral do retrato é de se estar a captar um instantâneo da realidade, associando passado, presente e futuro - combinando tempos. Traduz uma realidade em mutação, que se associa à própria aceleração do tempo introduzida no século XX.
Deste modo, o quadro introduz uma sensação de modernidade, que é reforçada pelo próprio cenário. Alda Lino está sentada numa cadeira de linhas rectas, que lembra as cadeiras do estilo da Arte Nova (Escola de Glasgow) ou da Secessão de Viena. A cadeira era provavelmente desenhada pelo próprio Raul Lino - assim como a mesa. De facto, quando em 1907, Raul Lino se casou com Alda Decken dos Santos, foi viver para um prédio da Avenida António Augusto de Aguiar. Segundo o arquitecto: «A nossa casa encheu-se de imediatismo, embora eu nunca perdesse as estribeiras; havia cores desusadas, portas decoradas, tectos rebaixados (...) e móveis que eu desenhara de propósito e que me pareciam participar igualmente da almejada originalidade». Ramalho Ortigão, que visitou a casa, gabou «a combinação encontrada para juntar móveis de diferentes épocas, mas que todos se achavam ligados, entendo eu, como que por um denominador comum que é o sentimento natural e espontâneo, curtido no decorrer dos tempos e que se adquire pela observação enamorada e contínua dos fenómenos da vida e da natureza em todos os seus reinos».
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Margarida Elias, Columbano no seu Tempo (1857-1929), Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, 2011 (Tese de Doutoramento); Maria do Carmo Sousa Lino, As Artes Decorativas na Obra de Raul Lino, Lisboa, Universidade Lusíada, 1999 (Tese de Mestrado), pp. 60-62; «Um grande artista decorador: Raul lino», in Ilustração Portuguesa, 4 de Julho de 1910 (link).
2 comentários:
Gosto desta análise. O retrato é lindíssimo.
Beijinho. :)
Muito obrigada! Bjns!:)
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