Mikalojus Ciurlionis, The Thought (1904, Memorial Museum of M.Ciurlionis, Kaunas)
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Durante muito tempo, considerei que era a criatividade que nos tornava a nós, humanos, seres diferentes dos outros animais. Contudo, penso agora que, apesar de a criatividade ser (na minha opinião) muito importante, a memória é mais essencial. Só com o desenvolvimento da memória, nomeadamente depois da invenção da escrita e de outras formas de registo (desenho, pintura, fotografia, tipografia, informática, ...) é que conseguimos ir acumulando conhecimento. Esse conhecimento crescente e cada vez mais abrangente é que nos permite também desenvolver a criatividade. A memória por isso deve ser preservada, quer a memória histórica, ao nível da humanidade em geral, quer a memória pessoal e individual. Que seríamos nós sem memória? Assim como escreveu António Damásio:
«We all woke up this morning and we had with it the amazing return of our conscious mind. We recovered minds with a complete sense of self and a complete sense of our own existence — yet we hardly ever pause to consider this wonder.».
Sem memória (ou consciência auto-biográfica) todos os dias teríamos de recomeçar do zero, repetindo quando muito acções instintivas e que estivessem guardadas no nosso código genético (que também é uma forma de memória, não consciente). Porém, no limite, tanto o desenvolvimento da memória como o da criatividade requerem a criação de um sistema de comunicação com alguma complexidade, que permite transmitir aos nossos semelhantes o conhecimento adquirido.
Carl Spitzweg, Rose scent memory (1850)
É certo que há outros animais com boa memória, mas o nosso cérebro, na sua evolução, conseguiu levar essa capacidade a um patamar mais elevado. Não deixa de ser verdade, porém, que a falta de memória, se não for excessiva, também pode ter as suas vantagens, pois como disse Nietzsche: «The advantage of a bad memory is that one enjoys several times the same good things for the first time.»; ou Mark Twain: «A clear conscience is the sure sign of a bad memory.»
2 comentários:
A frase de N. é certeira.
No meu caso, acontece-me com os filmes ou as séries que gosto muito. Sei que estive atenta e que me marcou, no entanto, noto que não me recordo bem da história como gostaria. Resultado: posso rever sempre com igual prazer.
No que toca memória familiar, às vezes, tenho pena de não ter pedido as receitas da minha tia-avó, por exemplo. No mais, gosto muito de guardar fotos e cartas antigas. Mas, hoje em dia, parece que pouco se liga a isso. Acontece, por vezes, quando morre um primo de um dos avós, os netos oferecem-me algum espólio, porque sabem que valorizo essas memórias.
Beijinhos e bom Sábado!
Sandra - A minha memória também me permite reler alguns livros e filmes... mas às vezes falha, quando não deve. Eu também gosto muito de guardar memórias e de ler memórias. Bjns!
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