Franklin Figueiredo, Fotografia (Museu do Chiado – Museu Nacional de Arte Contemporânea - Link)
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Sempre me fascinaram as pessoas que nasceram no início do século XX e morreram no final desse século. O mundo mudou tanto ao longo desses cem anos, que nem imagino o que foi a vida delas - mesmo sem contar com as duas Grandes Guerras, Revoluções e outros acontecimentos. Faço apenas uma pálida ideia através das mudanças a que eu própria tenho assistido em cerca de quarenta anos de vida.
Ilustração Portuguesa (30/12/1922 - Link)
Quando eu nasci não existiam coisas que hoje são comuns, como computadores pessoais (muito menos portáteis), televisão a cores, DVD's, telemóveis, internet, e por aí em diante.
Ainda por cima, sou uma pessoa que demoro sempre algum tempo em aceitar as novas tecnologias. Por exemplo, só comprei CD's e leitores de CD quando quase já não conseguia encontrrar discos de vinil à venda nas lojas. O meu telemóvel é outro exemplo, porque está muito desactualizado e eu aguardo pacientemente que ele se estrague para ter uma boa desculpa para comprar um dos novos. Nem sei o que é um IPAD (é assim que se escreve?)... Também não consigo aderir ao acordo ortográfico (mas isso é outra história).
Wall-E (Link)
Se, por um lado, considero boa esta evolução e algumas das traquitanas que vamos acumulando; por outro, acho que tudo isto é um bocado excessivo.
Nem vou alongar-me sobre os problemas que traz ao nível ecológico (acumulação de lixo) e económico (as pessoas gastarem dinheiro e fazerem dívidas, para adquirirem coisas que na verdade não necessitam). Não vou também alongar-me sobre o terror que por vezes me causa o pensamento de haver uma catástrofe, recuarmos cerca de cem ou duzentos anos - e nos vermos de novo sem electricidade, água canalizada, frigoríficos e roupa de "pronto-a-vestir" - entre outras coisas que hoje em dia já consideramos tão normais que já olhamos para elas como se fossem direitos humanos.
Matrix (Link)
Do que quero falar é da saturação de informação. Hoje em dia, com a internet e os novos meios de comunicação, estamos tão inundados de informação que perdemos a capacidade de a processar convenientemente.
Nem vou discorrer sobre a quantidade de notícias que surgem nos telejornais, que me põem sempre a pensar se o mundo sempre foi assim terrível ou se somos nós que agora sabemos tudo ao segundo... Nem vou discorrer, também, sobre a quantidade de textos mais ou menos interessantes, publicados em toda a parte, por qualquer pessoa, que já lemos mais ou menos na diagonal - enquanto saltitamos para o texto seguinte. Só para dar uma ideia, neste momento tenho grande parte da minha biblioteca pessoal desactualizada, relativamente ao actual estado da investigação em História da Arte, tendo chegado ao ponto de desistir de comprar livros e passar a lê-los em bibliotecas.
Nem vou discorrer sobre a quantidade de notícias que surgem nos telejornais, que me põem sempre a pensar se o mundo sempre foi assim terrível ou se somos nós que agora sabemos tudo ao segundo... Nem vou discorrer, também, sobre a quantidade de textos mais ou menos interessantes, publicados em toda a parte, por qualquer pessoa, que já lemos mais ou menos na diagonal - enquanto saltitamos para o texto seguinte. Só para dar uma ideia, neste momento tenho grande parte da minha biblioteca pessoal desactualizada, relativamente ao actual estado da investigação em História da Arte, tendo chegado ao ponto de desistir de comprar livros e passar a lê-los em bibliotecas.
Claude Monet, Les nymphéas (Link)
Mas vou mencionar uma coisa que me anda a perturbar: a circulação fácil de imagens e de objectos artísticos de vários formatos. Só para dar um exemplo, vejo tanta pintura impressionista a circular em filmes, internet, livros e diversos objectos, que eu, que sempre gostei de Impressionismo, começo a cansar-me. Actualmente, mais depressa daria dinheiro (se o tivesse) por um quadro de Columbano ou de Sorolla (ou outro pintor menos mediático), do que por uma obra de Renoir.
Se é bom e justo o fácl acesso à informação - e eu, como historiadora de arte, dou graças pela internet, com o Google, Wikipaintings, Matriznet, Base Joconde, Artcyclopedia, Facebook, Hemeroteca Digital, SIPA (entre outras mil maravilhas) - também é cansativo o bombardeamento de informação, que surge de forma vertiginosa e muitas vezes repetitiva, ou, pior ainda, desactualizada e com erros.
Para ser muito sincera, quero que tudo isto exista, e exista cada vez mais. Mas também gostava que houvesse uma forma melhor de conseguir processar tantos dados. Sinto-me um pouco como na Torre de Babel...
Pieter Bruegel (o Velho), Construction of the Tower of Babel (1563, Kunsthistorisches Museum, Vienna - Link)
7 comentários:
Muitíssimo pertinente, o seu poste. Eu ainda não me cansei dos impressionistas (estou perto...), mas estou saturado dos pré-rafaelitas.
Penso que é fundamental fazer uma selecção rigorosa do que lemos, daquilo que queremos ver, daquilo que, verdadeiramente, precisamos de usar.
A propósito e solidariamente, o meu telemóvel também é "antiquíssimo"..:-)
Andamos em sintonia de pensamento...Também tenho pensado nisso - como era o mundo até à década de 90 do século passado e como é agora -, por causa da proximidade dos 43.
Nós ainda conhecemos um tempo mais lento e acho que somos umas felizardas por isso.
Todo este bombardeamento actual de informação não nos deixa fruir os momentos e os objectos e acaba por banalizar o belo, pelo efeito de saturação, como tão bem referes. Temos de nos proteger e encontrar os nossos refúgios para ir fazendo as necessárias actualizações ao nosso ritmo, até porque a energia já não é a mesma de há 20 anos...
Um post muito pertinente, Margarida!
Bjnhs!
Margarida
Adorei o seu texto. Ri-me com gosto quando escreveu sobre o IPAD. Julgo que as suas palavras traduzem muito bem um sentimento comum a muitos de nós.
Hoje há uma loucura quase completa por inovar. Tem que se inovar sempre e todos os dias. Nos cursos de gestão há uma cadeira só para Inovação e julgo que se farão mestrados e doutoramentos na matéria. O problema de tanta inovação tecnológica é que a população europeia está cada vez mais envelhecida e como toda a gente sabe, com a idade, começamos a perder a apetência pela novidade e pela inovação. Há um desajustamento entre a fobia de inovar e a população cada vez mais envelhecida, que esbarra e tropeça nas tecnologias que aparecem a cada hora, em substituição de outras, que ainda estão perfeitamente usáveis.
Abraços e parabéns pelo texto
APS - Concordo consigo, temos de seleccionar. Mas por vezes surge a tentação de agarrar uma boa fatia e ficamos logo com uma indigestão de informação... :)
Sandra - Depois de escrever este post pensava que o pior nem é a banalização do belo (e da maravilha). O pior é a crescente insensibilidade que vamos tendo perante as situações, mesmo as situações mais horríveis. Ainda hoje almocei, enquanto estava a ver casas inundadas na Sardenha, no telejornal. Não acho nornal... Beijinhos.
Luís - Concordo plenamente consigo. Porquê tanta inovação? E o pior é que temos de ser inovadores e produtivos mesmo em áreas do saber que requerem tempo e maturação. Teremos capacidade para processar tanta novidade em tão pouco tempo?
Sim, realmente... Os noticiários tratam as desgraças não só com muita ligeireza, mas também como se fossem espectáculos de entretenimento. Faz impressão. Parece tudo muito normal, não é? Há uma grande falta de decoro e tratamento sóbrio das situações, parece-me.
Algo que me espantou por aqui foi o facto do noticiário das 8 da noite durar só meia-hora. Não há uma exploração até à exaustão das misérias e desgraças. E ainda bem, para não ficarmos insensíveis a estas situações.
Bjns!
PS: Também nunca tive IPAD e o meu portátil é "uma cebola". É o meu marido a dizer que tenho de comprar um e eu a fazer ouvidos de marcador/mercador ;-)))
Sabe Margarida, penso que hoje não possuem mais aquela leveza da caligrafia, a fascinação que senti ao ver já mocinha a primeira imagem colorida. O sabor da Coca cola gelada, era chique, os espetinhos de queijo e azeitona enfeitavam as mesas.
Não me lembro de ver a felicidade estampada no rosto de crianças que ganham carros infantins motorizados ao invês de bicicletas, ou dos carinhos de rolimã que construíamos.
Cheguei a conclusão de que não sou eu que não acompanho a evolução, mas a nova geração que está deixando de aproveitar a vista belíssima que se tem, quando se sobe pela primeira vez e sozinha em um pé de laranja lima e imagino a quantidade de adultos que jamais saberão o que é uma bola de gude (da qual fui capeã na rua que morava durante 4 anos e ganhei uma falha no dedão da mão direita) jamais saberão o valor de uma bola bola de gude azul real, a mais valiosa na minha época. Mas espero que saibam apreciar Monet, como eu aprendi, assim, vou andando e vivendo, quem sabe um dia troco os sons da vida por um IPOD...acho difícil essa opção. Sobretudo uma opção.
Adorei ter vindo aqui.
bjs de todas nós e um meu.
Sandra - É verdade o que dizes. Tenho saudades dos telejornais de antigamente, que duravam meia hora, bem organizados, e que terminavam com as reportagens do Fernando Pessa. Quanto a computadores, ainda hoje se estragou o meu portátil e nem me preocupei. O fixo chega-me e sobra-me. Não me importo nada de estar numa biblioteca com um bloco de notas em vez de um notebook. Bjns!!
AMSK - Muito obrigada pelo seu testemunho. A vida podia ter menos traquitanas, mas era mais feliz em algumas coisas. E as crianças tinham experiências diferentes (brincadeiras, divertimentos) em culturas diferentes. Agora é tudo globalizado, informatizado e normalizado. Tudo muito rápido e nada se saboreia de facto. É pena, porque são tesouros que se vão perdendo, transformando-se em objectos de museu. Bjns!
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