«Estio», in Almanaque das Artes e Letras (1876)
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Gosto de almanaques e, outro dia, deparei com este, dirigido por Rangel de Lima, de que há exemplares entre 1874 e 1876, na Hemeroteca Digital. Por outro lado, julgo que já aqui escrevi que gosto de tudo o que serve para medir e organizar o tempo, incluindo almanaques. Numa rápida pesquisa, descobri que há um texto de Eça de Queirós sobre o tema, em que este diz:
«É que o Almanaque contém essas verdades iniciais que a Humanidade necessita saber, e constantemente rememorar, para que a sua existência, entre uma Natureza que lhe não é benévola, se mantenha, se prossiga toleravelmente. A essas verdades, a essas regras, chamam os Franceses, finos classificadores, verdades de Amanaque. São as grandes verdades vitais. O homem tudo poderia ignorar, sem risco de perecer, excepto que o trigo se semeia em Março. E se os livros todos desaparecessem, bruscamente, e com eles todas as noções, e só restasse, da vasta aniquilação, um Almanaque isolado, a Civilização guiada pelas indicações genéricas, sobre a Religião, o Estado, a Lavoura, poderia continuar, sem esplendor, sem requinte, mas com fartura e com ordem. Por isso os homens se apressaram a arquivar essas verdades de Almanaque, - antes mesmo de fixar em livros duráveis as suas Leis, os seus Ritos, os seus Anais. Antes de ter um Código, uma Cartilha, uma História, a cidade antiga teve um Almanaque».
Eça de Queirós, «Almanaques» in Almanach Encyclopedico, Lisboa, Livraria Antonio Maria Pereira, 1895-1896, citado in Vanda Anastácio (2012), «Almanaques, Origem, géneros, produção feminina», Veredas, 18, p. 53-74. Sobre este tema, ver também: Regina Cunha (2016) , «Folk communication in Portugal: a study about prose, popular lore and scientific knowledge of Portuguese almanacs / Folkcomunicação em Portugal: um estudo sobre a prosa, saber popular e conhecimento científico dos almanaques», in: LOPES, M.I.V.; ROMANCINI, R. (orgs) Anais Ibercom 2015: comunicação, cultura e mídias sociais. SP: ECA-USP, 2015, p. 7494-7507.
2 comentários:
Margarida
Também adoro almanaques. Em casa da minha família materna há uns quantos e ao longo da minha vida de bibliotecário cataloguei dúzias de almanaques e delicio-me sempre com eles. Os antigos anúncios são fantásticos e depois há todas aquelas informações úteis sobre como tirar uma nódoa de vinho, podar roseiras, receitas de genuína culinária portuguesa, as efemérides, textos literários e um mundo de coisas úteis e devidamente sintetizadas. Hoje o almanaque é um género em extinção, substituído pela wikipédia e pelo Google.
LuisY - É bem verdade. São muito interessantes. É pena que estejam a desaparecer, mas também só valeria a pena se fossem como os antigos, cheios dessas informações e textos, com imagens interessantes de bons artistas. Muito embora, de vez em quando compre o Borda d'Agua. Bom dia!
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