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«Assim abandonada dos fados e dos homens, Lisboa seria uma cidade quase inteiramente insulsa e inestética, (...) se não resgatasse estes defeitos, amplamente, a sua maravilhosa situação dominadora, e não a enriquecesse de pitoresco um rio como o Tejo, raro no Mundo, de gradações infinitas de colorido, irreais como panoramas entrevistos em sonhos (...).
Como aproveitou o lisboeta estas condições naturais tão singulares, esta dádiva do céu e da água? Que partido tirou ele do Tejo? Voltou-lhe as costas, simplesmente. Na faixa marginal da cidade tem-se a impressão de que as edificações que ali se ergueram obedeceram à intenção de tapar com um biombo de cantaria a vista do Tejo como a de um vizinho incómodo. Ter essa maravilha ali ao lado parece ao lisboeta uma impertinência da natureza, de mau gosto. E assim, em vez de tudo convergir para o rio fantástico, de ele ser o fundo de quadros decorativos, (...) corre ali um paredão inestético de casaria, de fábricas, de armazéns, e até de gasómetros, ocultando ao lisboeta a vista do seu largo e claro rio (...)».
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Raúl Proença (dir.), Guia de Portugal, Vol. I, Lisboa e Arredores, 1.ª ed. 1924, ed. Fundação Calouste Gulbenkian, 3.ª ed. 1991, pp. 179-181.
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Notas:
1) Acho que estamos a melhorar a relação com o rio, desde a Expo 98, mas ainda há muito trabalho a fazer, no sentido de criar, como propunha Raúl Proença, junto do rio, «uma das mais belas avenidas do Mundo».
2) Ainda estou sem os meus documentos. Ontem descobri que o problema era do disco, que foi retirado do computador e colocado numa caixa externa, mas só consegui abrir uma pequeníssima parte do que lá estava. Tenho uma réstia de esperança de conseguir abrir os restantes documentos, mas que começa a esmorecer...