domingo, 31 de março de 2013

Criatividade & Coragem


Bernard Scholl, Colors & Tools.
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«Creativity takes courage».
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sábado, 30 de março de 2013

Feliz Páscoa!

Maurice Prendergast, Easter Procession, St. Marks (c. 189-1899, in The Athaneum).
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Com votos de uma Feliz Páscoa para todos!

sexta-feira, 29 de março de 2013

Suave Milagre

Eduardo Teixeira Coelho (Link).
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SUAVE MILAGRE

NESSE tempo Jesus ainda se não afastara da Galileia e das doces, luminosas margens do Lago de Tiberíade: - mas a nova dos seus milagres penetrara já até Enganim, cidade rica, de muralhas fortes, entre olivais e vinhedos, no país de Issachar.
Uma tarde um homem de olhos ardentes e deslumbrados passou no fresco vale, e anunciou que um novo profeta, um rabi formoso, percorria os campos e as aldeias da Galileia, predizendo a chegada do reino de Deus, curando todos os males humanos. E enquanto descansava sentado à beira da Fonte dos Vergéis, contou ainda que esse rabi, na estrada de Magdala, sarara da lepra o servo dum decurião romano só com estender sobre ele a sombra das suas mãos; e que noutra manhã, atravessando numa barca para a terra dos Gerassénios, onde começava a colheita do bálsamo, ressuscitara a filha de Jaira, homem considerável e douto que comentava os Livros na Sinagoga. E como em redor, assombrados, seareios, pastores, e as mulheres trigueiras com a bilha no ombro, lhe perguntassem se esse era, em verdade, o Messias da Judeia e se diante dele refulgia a espada de fogo, e se o ladeavam, caminhando como as sombras de duas torres, as sombras de Gog e de Magog - o homem, sem mesmo beber daquela água tão fria de que bebera Josué, apanhou o cajado, sacudiu os cabelos, e meteu pensativamente por sob o aqueduto, logo sumido na espessura das amendoeiras em flor. Mas uma esperança, deliciosa como o orvalho nos meses em que canta a cigarra, refrescou as almas simples: logo, por toda a campina que verdeja até Ascalon, o arado pareceu mais brando de enterrar, mais leve de mover a pedra do lagar; as crianças, colhendo ramos de anémonas, espreitavam pelos caminhos se além, da esquina do muro, ou de sob o cicómoro, não surgiria uma claridade; e nos bancos de pedra, às portas da cidade, os velhos, correndo os dedos pelos fios das barbas, já não desenrolavam, com tão sapiente certeza, os ditames antigos. 
Ora então vivia em Enganim um velho, por nome Obed, duma familia pontifical de Samaria, que sacrificara nas aras do Monte Ebal, senhor de fartos rebanhos e de fartas vinhas - e com o coração tão cheio de orgulho como o seu celeiro de trigo. Mas um vento arido e abrasador, esse vento de desolação que ao mando do Senhor sopra das torvas terras de Assur, matara as reses mais gordas das suas manadas, e pelas encostas onde as suas vinhas se enroscavam no olmo, e se estiravam na latada airosa, só deixara, em torno dos olmos e pilares despidos, sarmentos, cepas mirradas, e a parra roida de crespa ferrugem. E Obed, agachado à soleira da sua porta, com a ponta do manto sobre a face, palpava a poeira, lamentava a velhice, ruminava queixumes contra Deus cruel.
Apenas ouvira falar desse novo rabi da Galileia, que alimentava as multidões, amedrontava os demonios, emendava todas as desventuras - Obed, homem lido, que viajara na Fenicia, logo pensou que Jesus seria um desses feiticeiros tão acostumados na Palestina, como Apolonio, ou Rabi Bem-Dossa, ou Simão, o Subtil. Êsses, mesmo nas noites tenebrosas, conversam com as estrelas, para eles sempre claras e faceis nos seus segredos: com uma vara afugentam de sobre as searas os moscardos gerados nos lodos do Egipto: e agarram entre os dedos as sombras das arvores, que conduzem, como toldos beneficos, para cima das eiras, à hora da sesta. Jesus da Galileia, mais novo, com magias mais viçosas decerto, se ele largamente o pagasse, sustaria a mortandade dos seus gados, reverdesceria os seus vinhedos. Então Obed ordenou aos seus servos que partissem, procurassem por toda a Galileia o rabi novo, e com promessa de dinheiros ou alfaias o trouxessem a Enganim, no país de Isaachar.
Os servos apertaram os cinturões de oiro - e largaram pela estrada das Caravanas, que, costeando o lago, se estende até Damasco. Uma tarde, avistaram sobre o poente, vermelho como uma romã muito madura, as neves finas do monte Hermon. Depois, na frescura duma manhã macia, o lago de Tiberiade resplandeceu diante deles, transparente, coberto de silencio, mais azul que o céu, todo orlado de prados floridos, de densos vergeis, de rochas de pórfiro, e de alvos terraços por entre os pomares, sob o vôo das rolas.
Um pescador que desamarrava a sua barca duma ponta de relva, assombreada de aloendros, escutou, sorrindo, os servos. O Rabi de Nazareth? Oh, desde o mês de Ijar, o Rabi descera, com os seus discipulos, para os lados para onde o Jordão leva as águas.
Os servos, correndo, seguiam pelas margens do rio, até adiante do vau, onde ele se estira num largo remanso, e descansa, e um instante dorme, imóvel e verde, à sombra dos tamarindos. Um homem da tribo dos Essénios, todo vestido de linho branco, apanhava lentamente ervas salutares, pela beira da água, com um cordeirinho branco ao colo. Os servos humildemente saudaram-no, porque o povo ama aqueles homens de coração tão limpo e claro e cândido como as suas vestes cada manhã lavadas em tanques purificados. E sabia ele da passagem do novo Rabi da Galileia, que como os Essénios ensinava a doçura, e curava as gentes e os gados? O essénio murmurou que o Rabi atravessara o Oásis de Engaddi, depois se adiantara para além...
- Mas onde, "além"?
- Movendo um ramo de flores roxas que colhera, o essénio mostrou as terras de além Jordão, a planície de Moab. Os servos vadearam o rio - e debalde procuraram Jesus, arquejando pelos rudes trilhos, até às fragas onde se ergue a cidadela sinistra de Makaur... No Povo de Yakob repousava uma larga caravana, que conduzia para o Egito mirra, especiarias e bálsamos de Gilead; e os cameleiros, tirando a água com os baldes de coiro, contaram aos servos de Obed que em Gadara, pela lua nova, um Rabi maravilhoso, maior que David ou Isaías, arrancara sete demonios do peito duma tecedeira, e que, à sua voz, um homem degolado pelo salteador Barrabás se erguera da sua sepultura e recolhera ao seu horto. Os servos, esperançados, subiram logo açodadamente pelo caminho dos Peregrinos até Ganara, de altas torres, e ainda mais longe até às nascentes da Amalha... Mas Jesus, nessa madrugada seguido por um povo que cantava e sacudia ramos de mimosa, embarcara no Lago, num batel de pesca, e à vela navegara para Magdala. E os servos de Obed, descoroçoados, de novo passaram o Jordão na ponte da Filhas de Jacob. Um dia, já com as sandálias rotas dos longos caminhos, pisando já as terras da Judeia Romana, cruzaram um fariseu sombrio, que recolhia a Efraim, montado na sua mula. Com devota reverência detiveram o homem da lei. Encontrara ele por acaso esse profeta novo da Galileia que, como um Deus passeando na terra, semeava milagres? A adunca face do fariseu escureceu enrugada e a sua cólera retumbou como um tambor orgulhoso:
- Oh escravos pagãos! Oh blasfemos! Onde ouvistes que existissem profetas ou milagres fora de Jerusalém? Só Jeová tem força no seu templo. De Galileia surgem os néscios e os impostores...
E como os servos recuavam ante o seu punho erguido, todo enrodilhado de dísticos sagrados - o furioso doutor saltou da mula, e, com as pedras da estrada, apedrejou os servos de Obed, uivando: Racca! Racca! e todos os análtemas rituais. Os servos fugiram para Enganim. E grande foi a desconsolação de Obed porque os seus gados morriam, as suas vinhas secavam -, e todavia radiantemente, como uma alvorada por detrás de serras, crescia, consoladora e cheia de promessas divinas, a fama de Jesus da Galiléia.
Por esse tempo, um centurião romano, Publius Septimus, comandava o forte que domina o vale de Cesarea, até à cidade e ao mar. Publius, homem áspero, veterano da campanha de Tibério contra Partos, enriquecera durante a revolta da Samaria com presas e saques, possuía minas na Ática, e gozava, como favor supremo dos deuses, a amizade de Flacous, legado imperial da Síria. Mas uma dor roía a sua prosperidade muito poderosa, como um verme rói um fruto muito suculento. Sua filha única, para ele mais amada que vida e bens, definhava com um mal subtil e lento, estranho mesmo ao saber dos esculapios e mágicos que ele mandara consultar a Sidon e a Tiro. Branca e triste como a lua num cemitério, sem um queixume, sorrindo pàlidamente a seu pai, definhava, sentada na alta esplanada do forte, sob um velário, alongando saudosamente os negros olhos tristes pelo azul do mar de Tiro, por onde ela navegara de Itália, numa opulenta galera. Ao seu lado, por vezes, um legionário entre as ameias apontava vagarosamente ao alto a flexa, e varava uma grande águia, voando de asa serena, no ceu rutilante. A filha de Septimus seguia um momento a ave, torneando até bater morta sobre as rochas; - depois, com um suspiro, mais triste e mais pálido, recomeçava a olhar para o mar.
Então, Septimus, ouvindo contar, a mercadores de Chorazin, deste Rabi admirável tão potente sobre os espíritos, que sarava os males tenebrosos da alma, destacou três decurias de soldados para que o procurassem pela Galiléia, e por todas as cidades da Decapola, até à costa e até Ascalon. Os soldados enfiaram os escudos nos sacos de lona, espetaram nos elmos ramos de oliveira - e as suas sandálias ferradas apressadamente se afastaram, ressoando sobre as lajes de basalto da estrada romana, que desde Cesarea até Lago corta tôda a Tetrachia de Herodes. As suas armas, de noite, brilhavam no topo das colinas, por entre a chama ondeante dos archotes erguidos. De dia invadiam os casais, rebuscavam a espessura dos pomares, esfuracavam com a ponta das lanças a palha das medas; e as mulheres, assustadas, para amansar logo acudiam com bolos de mel, figos novos, e malgas cheias de vinho, que eles bebiam dum trago, sentados à sombra dos sicómoros. Assim correram a Baixa Galiléia - e, do Rabi, só encontravam o sulco luminoso nos corações. Enfastiados com as inuteis marchas, desconfiando que os judeus sonegassem o seu feiticeiro para que Romanos não aproveitassem do superior feitiço, derramavam com tumulto a sua cólera, através da piedosa terra submissa. A entrada das pontes detinham os peregrinos, gritando o nome do Rabi, rasgando os véus às virgens: e, à hora em que os cantaros se enchem nas cisternas invadiam as ruas estreitas dos burgos, penetravam nas sinagogas e batiam, sacrilegamente com os punhos das espadas nas Thebahs, os Santos Armadios de cedro que continham os Livros Sagrados. Nas cercanias de Hebron arrastaram os solitarios pelas barbas para fora das grutas, para lhes arrancar o nome do deserto ou do palmar em que se ocultava o Rabi; - e dois mercadores fenícios que vinham de Jopé com uma carga de malobatro, e a quem nunca chegara o nome de Jesus, pagaram por esse delito cem dramas a cada centurião. Já as gentes dos campos, mesmo os bravios pastores de Idumea, que levam as reses brancas para o Templo, fugiam espavoridos para as serranias apenas luziam nalguma volta do caminho as armas do banco violento. E da beira dos eirados, as velhas sacudiam como taleigos a ponta dos cabelos desgrenhados, e arrojavam sobre eles as Más-Sortes, invocando a vingança de Elias. Assim tumultuosamente erraram até Ascalon; não encontraram Jesus: e retrocederam ao longo da costa enterrando as sandálias nas areias ardentes.
Numa madrugada, perto de Cesarea, marchando num vale, avistaram sobre um outeiro um verde-negro bosque de loureiros, onde alvejava, recolhidamente, o fino e claro pórtico dum templo. Um velho, de compridas barbas brancas, coroado de folhas de louro, vestido com uma túnica cor de açafrão, segurando uma curta lira de três cordas, esperava gravemente, sobre os degraus de mármore, a aparição do Sol. Debaixo, agitando um ramo de oliveira, os soldados bradaram pelo sacerdote. Conhecia ele um novo profeta que surgira na Galileia, e tão destro em milagres que ressuscitava os mortos e mudava a água em vinho? Serenamente, alargando os braços, o sereno velho exclamou por sobre a rociada verdura do vale:
- Oh romanos, pois acreditais que em Galileia ou Judeia apareçam profetas consumando milagres? Como pode um bárbaro alterar a ordem instituída por Zeus?... Mágicos e feiticeiros são vendilhões, que murmuram palavras ocas, para arrebatar a espórtula dos simples... Sem a permissão dos Imortais nem um galho seco pode tombar da árvore, nem seca folha pode ser sacudida na árvore. Não há profetas, não há milagres... Só Apolo Delfico conhece o segredo das coisas!
Então, devagar, com a cabeça derrubada, como uma tarde de derrota, os soldados recolheram à fortaleza de Cesarea. E grande foi o desespero de Septimus, porque sua filha morria, sem um queixume, olhando o mar de Tiro - e todavia a fama de Jesus, curador dos lânguidos males, crescia, sempre consoladora e fresca, como a margem da tarde que sopra do Hermon e, através dos hortos, reanima e levanta os açucenas pendidas.
Ora entre Enganim e Cesarea, num casebre desgarrado, sumido na prega dum cerro vivia a esse tempo uma viúva, mais desgraçada mulher que todas as mulheres de Israel. O seu filhinho único, todo aleijado, passara do magro peito a que ela o criara para os farrapos da enxerga apodrecida, onde jazera, sete anos passados, mirrando e gemendo. Também a ela a doença a engelhara dentro dos trapos nunca mudados, mais escura e torcida que uma cepa arrancada. E, sobre ambos, espessamente a miséria cresceu como o bolor sobre cacos perdidos num ermo. Até na lâmpada de barro vermelho secara há muito o azeite. Dentro da arca pintada não restava grão ou côdea. No Estio, sem pasto, a cabra morrera. Depois, no quinteiro, secara a figueira. Tão longe do povoado, nunca esmola de pão ou mel entrava o portal. E só ervas apanhadas nas fendas das rochas, cozidas sem sal, nutriam aquelas criaturas de Deus na terra escolhida, onde até às aves maléficas sobrava o sustento.
Um dia um mendigo entrou no casebre, repartiu do seu farnel com a mãe amargurada e um momento sentado na pedra da lareira, coçando as feridas das pernas, contou dessa grande esperança dos tristes, esse Rabi que aparecera na Galileia, que de um pão no mesmo cesto fazia sete, e amava todas as criancinhas, e enxugava todos os prantos, e prometia aos pobres um grande e luminoso reino, de abundância maior que a corte de Salomão. A mulher escutava com olhos famintos. E esse doce Rabi, esperança dos tristes, onde se encontrava? O mendigo suspirou. Ah, esse doce Rabi! quantos o desejavam, que se desesperançavam! A sua fama andava por sobre toda a Judeia como o Sol que até por qualquer velho muro se estende e se goza; mas para enxergar a claridade do seu rosto, só aqueles ditosos que o seu desejo escolhia. Obed, tão rico, mandara os seus servos por toda a Galileia para que procurassem Jesus, o chamassem com promessa a Enganim; Septimus, tão soberano, destacara os seus soldados até à costa do mar, para que buscassem Jesus, o conduzissem, por seu mando, a Cesarea. Errando, esmolando por tantas estradas, ele topara os servos de Obed, depois os legionarios de Septimus. E todos voltavam como derrotados, com as sandálias rotas, sem ter descoberto em que mata ou cidade, em que toca ou palácio, se escondia Jesus.
A tarde caía. O mendigo apanhou o seu bordão, desceu pelo duro trilho, entre a urze e a rocha. A mãe retomou o seu canto, mais vergada, mais abandonada. E então o filhinho, num murmúrio mais débil que o roçar duma asa, pediu à mãe que lhe trouxesse esse Rabi, que amava as criancinhas ainda as mais pobres, sarava os males ainda os mais antigos. A mãe apertou a cabeça esguedelhada:
- Oh filho! e como queres que te deixe, e me meta aos caminhos, à procura do Rabi da Galileia? Obed é rico e tem servos, e debalde buscaram Jesus, por areias e colinas, desde Chorazin até ao país de Moab. Septimus é forte, e tem soldados, e debalde correram por Jesus, desde o Hebron até ao mar. Como queres que te deixe? Jesus anda por muito longe e a nossa dor mora conosco, dentro destas paredes, e dentro delas nos prende. E mesmo que o encontrasse, como convenceria eu o Rabi tão desejado, por quem ricos e fortes suspiram, a que descesse através das cidades até este ermo, para sarar um entrevadinho tão pobre, sobre enxerga tão rota?
A criança, com duas lágrimas na face magrinha, murmurou:
- Oh, mãe, Jesus ama todos os pequeninos. E eu ainda tão pequeno, e com um tão mal pesado, e que tanto queria sarar!
- Oh, meu filho, como te posso deixar? Longe são as estradas da Galileia, e curta a piedade dos homens. Tão rota, tão trôpega, tão triste, até os cães me ladrariam da porta dos casais. Ninguém atenderia o meu recado, e me apontaria a morada do doce Rabi. Oh filho! talvez Jesus morresse... Nem mesmo os ricos e os fortes o encontram. O céu o trouxe, o céu o levou. E com ele para sempre morreu a esperança dos tristes.
De entre os negros trapos, erguendo as suas pobres mãozinhas que tremiam, a criança murmurou:
- Mãe, eu queria ver Jesus...
E logo, abrindo devagar a porta e sorrindo Jesus disse á criança:
- Aqui estou. 
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quinta-feira, 28 de março de 2013

Sexta-Feira Santa



Jan Van Eyck, The Ghent Altarpiece (1432, Catedral de Bavon, Ghent - Links: I, II, III e IV)
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«Na tradição cristã, a “árvore da vida” do Génesis (a árvore da primeira aliança, do Antigo Testamento) associa-se à árvore da cruz (a árvore da nova aliança, do Novo Testamento). A cruz erguida no monte Gólgota, árvore sagrada por excelência, é também uma árvore cósmica. Instrumento de suplício e de redenção, ao dar a vida através da morte, a cruz cristã reúne os dois sentidos extremos da árvore».
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Isabel Mayer Godinho Mendonça, «A “Árvore da Vida” nas Artes Decorativas – os Sentidos de uma Imagem, entre o Ocidente e o Oriente», in MENDONÇA, Isabel Mayer Godinho, CORREIA, Ana Paula Rebelo (Coord.), As Artes Decorativas e a Expansão Portuguesa, Lisboa, ESAD-FRESS, 2008,  pp. 91-92.

quarta-feira, 27 de março de 2013

A Eucaristia e a Paz

Alexander Coosemans, Allégorie de l’Eucharistie (Musée de Tessé, Le Mans - Link).
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Alart, or Alexander Coosemans (1627–1689) foi um pintor flamengo, autor de naturezas-mortas, sobretudo de frutos. Esta pintura, que aqui reproduzo, tem paralelo com outras do mesmo tema e da mesma época, como a de Jan Davidsz de Heem (1648). 
Olhando esta obra, que nos remete para a Eucaristia e celebra a Última Ceia, não posso deixar de ter dois pensamentos distintos. O primeiro tem a ver com a ideia de Paz que é transmitida pelo ritual eucarístico: «Cordeiro de Deus que tirais o pecado do Mundo dai-nos a Paz». É o sacríficio pascal: o pão e o vinho, que aqui surgem duplamente representados, quer pela hóstia e pelo cálice, quer pelo trigo e pelas uvas. 
O segundo pensamento tem a ver com a sensação de abundância transmitida nesta pintura: de ambos os lados do cálice vêem-se cornucópias, que transmitem um significado de prosperidade, de onde partem frutos - os quais também se encontram junto da base do cálice. Essa abundância terá uma mensagem de partilha, que é um princípio cristão. 
Cada fruto possui um significado simbólico, que se esconde atrás da riqueza naturalista da sua representação. Para além das espigas, já mencionadas, também as outras flores e frutos tinham um valor alegórico: a videira era a alegria e símbolo de Cristo, da Eucaristia e da Ressurreição; a rosa simbolizava a graça e a Virgem; as uvas a Eucaristia - as brancas a água, as pretas o vinho; os limões indicavam vontade e fidelidade; as romãs o Império, a realeza, mas também a concórdia, a Ressurreição e a esperança; os pêssegos, por fim, terão o mesmo significado das maçãs: associavam-se à Virgem e à Redenção. Num poema de Sóror Maria do Céu pode ler-se:

«A Senhor louvemos
Pelas frutas belas
Que criou regalo
Sendo providência»


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Bibliografia: Vítor Serrão (Coord.), Josefa de Óbidos e o Tempo Barroco, 1993; Norbert Schneider, Still Life, Taschen, 1994; Carla Alferes Pinto, Josefa de Óbidos, Quidnovi, 2010.

terça-feira, 26 de março de 2013

Sobre o Perdão

Childe Hassam, Brittany Peasant at The Pardon (1897).
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«What is tolerance? - it is the consequence of humanity. We are all formed of frailty and error; let us pardon reciprocally each other's folly -- that is the first law of nature». 
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segunda-feira, 25 de março de 2013

Por onde andará a Primavera?

Será culpa do Gargamel (ou Gasganete) que raptou a Mãe Natureza (Link)?

(Link)
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Ou será outro o caso, igualmente nefando?
Contado aqui*:

Que teve boa solução:

*BD publicada pela primeira vez em 1966 no Pilote, n.º 334, in R. Gosciny e A. Uderzo, Astérix la Rentrée Gauloise, Les Éditions Albert René.
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Entretanto, vamos-nos preparando para a Páscoa

(Link)

E tomando notas para festejar condignamente a Primavera:

Patrick McDonnell (Link).

domingo, 24 de março de 2013

A Anunciação I

Orazio Gentileschi, Anunciação (c. 1623).
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Todas as obras de arte com temas religiosos e, pelo menos, até ao período contemporâneo, guardam um significado simbólico que se observa na maneira como os temas são interpretados pelo artista - com influência maior ou menor dos encomendadores ou destinatários. Nas "Anunciações" este facto torna-se mais aliciante, pois na sua maioria, cada uma das pinturas com este tema tem em si uma miríade de detalhes, cujo significado enriquece e aprofunda a leitura das composições. Encontrei na internet três textos que abordam esta questão, os quais irei utilizar na interpretação desta extraordinária Anunciação de Orazio Gentileschi (1563-1639).
Numa primeira leitura vemos a Virgem ouvindo e acatando as palavras de São Gabriel, ajoelhado à sua esquerda. Dentro de um esquema tradicional, a Virgem está do lado interior, mais recatado; o Anjo está do lado que fica mais próximo da janela, junto da entrada de luz. A Virgem está de pé, não se encontra entronizada, o que é testemunho de uma tradição que vinha desde o final da Idade Média, sobretudo devida aos Franciscanos, que defendiam uma imagem de Maria mais humanizada. A representação de Nossa Senhora num quarto, num ambiente quotidiano, tem a ver também com uma mística que reforça a importância da sua humildade. São Bernardo escreveu numa homilia acerca da Anunciação: «A virtude da virgindade é digna de louvor, mas a humildade é mais necessária». 
A pomba, que se vê a entrar pela janela aberta, no canto superior direito, é, como é sabido, imagem do Espírito Santo. O facto de entrar com a luz, em direcção à orelha de Santa Maria, simboliza o acto da concepção, que tomou lugar no ouvido da Virgem: o Verbo encarnou pela Palavra Divina, isto é pela audição. Maria tem o Livro fechado e encostado junto ao peito, em sinal de meditação sobre a Palavra de Deus, pois o Livro evoca a profecia de Isaías (7:14) que anuncia a vinda do Salvador. O Anjo Gabriel, mensageiro de Deus, leva na mão um lírio branco, símbolo de pureza, que, neste caso, vem substituir o ceptro, símbolo do poder de Deus. A presença desta flor pode ser entendida ainda como uma alusão à Primavera, tempo privilegiado de flores, dado que no Calendário Juliano, esta estação tinha início no dia 25 de Março, dia em que se festeja a Anunciação. O pano vermelho atrás de Maria será aqui uma evocação do Drap d´honneur. Reforça a autoridade de Maria e é possivelmente uma sugestão à ideia de que o Mistério da Encarnação deveria permanecer oculto ao demónio. A janela é um detalhe real que permite identificar o local por onde entra a luz, interpretada como o próprio Espírito Santo. É de notar também na coluna que separa o espaço da Virgem do espaço do Anjo, que fará parte da cama de Santa Maria (do dossel) e é também símbolo de Jesus. Por fim, devemos notar na cama, de lençóis brancos e imaculados, que indiciam humildade pela ausência de qualquer elemento decorativo. A cama introduz igualmente uma alusão ao Mistério da Concepção por acção do Espírito Santo.
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Bibliografia consultada:
Luís Alberto Esteves Casimiro, «Iconografia da Anunciação: símbolos e atributos», in Revista da Faculdade de Letras, I Série, Volume VII-VIII, Porto 2008-2009, pp. 151-174. http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/9411.pdf
Margaret B. Freeman, «The Iconography of the Merode Altarpiece», http://www.metmuseum.org/pubs/bulletins/1/pdf/3257688.pdf.bannered.pdf

sábado, 23 de março de 2013

A Anunciação

Anunciação (Fundação Ricardo do Espírito Santo Silva, Lisboa).
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Anunciação, Retábulo da Igreja da Madre de Deus (1515, Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa).
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Visitei há algum tempo o Museu da FRESS (o que recomendo vivamente) e fiquei fascinada com esta Anunciação, não só porque é o meu tema preferido na História da Arte, mas também porque me fez recordar a de Jorge Afonso da Igreja da Madre de Deus (MNAA). Contudo, depois, confrontando as duas obras, creio que a da FRESS não será de Jorge Afonso (a menos que seja uma parceria).
Segundo o site da FRESS, a Anunciação que eles expõem é da escola do Mestre da Lourinhã. Esta atribuição é por sua vez problemática, pois não está esclarecido quem seria este pintor e quais as obras que efectivamente são da sua oficina. Seja como for, julgo que existem pelo menos três detalhes que serão a chave da atribuição desta pintura: 1) a capa do anjo - que recorda a do do Retábulo da Sé do Funchal (também atribuído ao Mestre da Lourinhã), da Anunciação da Ermida do Paraíso (MNAA), ou ainda a das duas "Anunciações" presentes no Museu de Torres Vedras; 2) a Pomba do Espírito Santo, com aura circular dourada, presente na Anunciação da Ermida do Paraíso, na de Jorge Afonso e nos retábulos de Torres Vedras (mas ausente no do Funchal); 3) as feições e o penteado da Virgem que me lembram as da autoria de Gregório Lopes ou mesmo de Jorge Afonso. Acrescente-se ainda que há semelhanças curiosas entre o quadro da FRESS e o Van der Weyden (do post anterior), nomeadamente na figura da Virgem e do Anjo e, mais interessante, na cama vermelha.
O que julgo interessante na comparação entre estas duas pinturas - para além da atribuição - é o facto de serem um bom testemunho do estilo característico da pintura portuguesa do Renascimento: por um lado a influência italiana, que se nota na monumentalidade das figuras e na arquitectura de inspiração clássica das habitações (nas colunas, por exemplo, que simbolizam Cristo); por outro a influência flamenga, que se vislumbra no naturalismo do quotidiano e no gosto pelos pequenos detalhes decorativos e simbólicos. Creio que a pintura portuguesa fez uma síntese muito pessoal destas duas influências, resultando numa estilística original, simultaneamente serena e piedosa, que dignifica as figuras bíblicas sem lhes retirar naturalidade. 
Acrescento por fim que a atribuição das obras, é sempre um exercício difícil cuja importância até poderá ser questionada. Escreveu-se já que grande parte da produção artística, até à época moderna e contemporânea, ficou anónima. Contudo, este tipo de trabalho de atribuição tem sido desenvolvido e aprimorado, porque tem vantagens para a historiografia: permite precisar as coordenadas espaciais e temporais de uma obra; aproximar obras e fazer comparações; tirar conclusões e preparar as bases para novas teorias sobre um determinado assunto. Eu não estou de momento com a possibilidade de aprofundar este tema, mas adoraria assistir a uma exposição de "Anunciações da Pintura Portuguesa", sobretudo se fosse acompanhada por um bom catálogo.
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Bibl. consultada: André Chastel (Pref.), L'Atelier du Peintre, Larousse, 1998; Paulo Pereira (Dir.), História da Arte Portuguesa, Vol. II, Temas & Debates, 1995.

sexta-feira, 22 de março de 2013

Arte e Mistério


Rogier van der Weyden, Tríptico da Anunciação (c. 1440, Musée du Louvre, Paris - via Web Gallery of Art)
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«The most beautiful experience we can have is the mysterious - the fundamental emotion which stands at the cradle of true art and true science». 
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quinta-feira, 21 de março de 2013

Percepção

Akseli Gallen-Kallela, Lake Keitel (1905, via Old Paint).
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«The universe as we know it is a joint product of the observer and the observed».
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PierreTeilhard de Chardin.

quarta-feira, 20 de março de 2013

Para o Dia da Árvore e da Poesia

Paulo Galindro (Link)
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Sophia de Mello Breyner Andresen, «Poesia e Realidade»:

«A Poesia existe em si - independente do homem. Realidade das coisas, ela existe mesmo onde ninguém a vê e onde ninguém a conhece».
(...)
«Pois a Poesia é a própria existência das coisas em si, como realidade inteira (...)»

«A poesia é a relação do homem com a Poesia (...)».
«(...) A verdadeira ânsia dos poetas é uma ânsia de fusão e de unificação com as coisas».
(...)

«O poema vem como um intermediário, é ele que torna possível que a poesia não se quebre contra os seus próprios limites. Podemos dizer por isso que o poema é liberdade».
(...)
«O poeta vê a Poesia, vive a poesia e faz o poema».

«A poesia e a poesia não são criação. São realidade e vivência. Porém o poema é criação, é um objecto a mais no mundo, uma realidade entre as realidades».
(...)
«O poema aparece, porque é necessário à existência do poeta (...)».
«O poema aparece como um medianeiro. Aparece ao lado da lacuna, que impede a união absoluta com a Poesia. É uma forma de tornar total o que estava incompleto».
«(...) Não podendo atingir a união absoluta com a realidade, o poeta faz o poema onde o seu ser e a realidade estão indissolúvelmente unidos».
«Por isso o poema é o selo da aliança do homem com as coisas».
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In Colóquio, n.º8, Abril de 1960, pp. 53-54.

terça-feira, 19 de março de 2013

Para dar as boas vindas à Primavera

Warwick Goble (Link).
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«Can words describe the fragrance of the very breath of spring?»
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segunda-feira, 18 de março de 2013

"Pê" para o Dia do Pai

(Link)

A minha escolha

A escolha do meu marido

A escolha da minha filha

A escolha do meu filho

E a vossa escolha, qual seria? Há muitas hipóteses (Link e Link).

domingo, 17 de março de 2013

Histórias infantis

Charles Haigh Wood, Storytime (1893, Link).
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Carlton Alfred Smith, The Young Readers (1893, Link).
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Lee Lufkin Kaula, Mother Reading with Two Girls (Link).
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«Fantasy is storytelling with the beguiling power to transform the impossible into the imaginable, and to reveal our own “real” world in a fresh and truth-bearing light».
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Leonard S. Marcus.

sábado, 16 de março de 2013

«Na Leitura e na Escrita Encontramo-nos Todos naquilo que Temos de Mais Humano»

Marianne Preindelsberger StokesCandlemas Day (1901, Link).
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«A escrita, ou a arte, para ser mais abrangente, cumpre funções que mais nenhuma área consegue cumprir. (...) Sinto que há poucas experiências tão interessantes como quando se lê um livro e se percebe "já senti isto, mas nunca o tinha visto escrito", procurar isso, ou procurar escrever textos que façam sentir isso, é uma das minhas buscas permanentes. Trata-se de ordenar, de esquematizar, não só sentimentos como ideias que temos de uma forma vaga mas que entendemos melhor quando os vemos em palavras. Trata-se também de construir empatia: através da leitura temos oportunidade de estar na pele de outras pessoas e de sentir coisas que não fazem parte da nossa vida, mas que no momento em que lemos conseguimos perceber como é. E isso faz-nos ser mais humanos. Na leitura e na escrita encontramo-nos todos naquilo que temos de mais humano».
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José Luís Peixoto, in Diário de Notícias (2003, Link).

sexta-feira, 15 de março de 2013

Ler II

Elizabeth Shippen Green, The Library (Link).
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Paul Thurlby, L for librarian (Link)
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«La vertu paradoxale de la lecture est de nous abstraire du monde pour lui trouver un sens».
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quinta-feira, 14 de março de 2013

Ler I

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«Quem não lê, não quer saber; quem não quer saber, quer errar».
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quarta-feira, 13 de março de 2013

Ler

Peter Ilsted, Interior with girl reading (1908).
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«You're never alone when you're reading a book». 
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terça-feira, 12 de março de 2013

Interior e Exterior I

Seymour Joseph Guy, Young Girl Reading (1877).
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«The time has come to realise that an interpretation of the universe — even a positivist one— remains unsatisfying unless it covers the interior as well as the exterior of things; mind as well as matter. The true physics is that which will, one day, achieve the inclusion of man in his wholeness in a coherent picture of the world».
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(Link)

segunda-feira, 11 de março de 2013

Interior e Exterior


Carl Larsson, La sala de lectura (1909, Link)
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«It was good to walk into a library again; it smelled like home».
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domingo, 10 de março de 2013

Exterior e Interior

(Link)
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«What I love most about my home is who I share it with».
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sábado, 9 de março de 2013

Estrelas

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«In the restlessness of the night, the stars mark out points of hope in the sky».
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Julio Gonzalez,
Citado por Rosalind E. Krauss, The Originality of the Avant-Garde and Other Modernist Myths, MIT Press, 1999, p. 119.

sexta-feira, 8 de março de 2013

À Espera de Dias de Sol

George Harcourt, Borrowed Plumes (Link).
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«(…) Para nós o sol é a mais poderosa fonte da melhor das luzes, despertadora de energias, elemento essencial da higiene e generosa dispensadora de alegria. Deixar entrar a luz do sol em nossas casas, larga, fortemente, equivale a abrir as portas à saúde (…)».
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Raul Lino, Casas Portuguesas – Alguns Apontamentos sobre o arquitectar das Casas Simples, Lisboa, Edições Cotovia, 1992 (1.ª ed. Lisboa, Valentim de Carvalho, 1933), p. 34.

Para as mulheres que têm belíssimos blogues e outros excelentes projectos

(Link)
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Emília Matos e Silva com Constante Procura (generalista e arte), Mariana em Retratos de Varsóvia (sobre vida de uma portuguesa na Polónia), Cátia Mourão em Uma Sombra Projectada no Silêncio (sobre a depressão e já publicado em livro), MR e Ana no Prosimetron e (In)Cultura (só da Ana) (ambos culturais), Sandra no Presépio com Vista para o Canal (sobre uma portuguesa na Holanda), Elsa Mendes em Ars Super Omnia (sobre ópera e cinema), Sandra Tomás Pereira em Piripiri Blog (sobre o seu projecto de trabalhos de costura e artesanato), Sara em Etnografia de Circunstância(s) (cultural), Cláudia Ribeiro da Livraria Lumière (alfarrabista), as senhoras de The Dutchess (da vida), Ilustração Portuguesa (imprensa antiga) e Old Paint (arte e pintura), bem como O Falcão de Jade (da vida, da música e da arte), Alberti's Window (sobre arte), Cozinha dos Vurdóns (em defesa do povo cigano e sobre culinária), Ana Carvalho em No Mundo dos Museus (sobre museologia), Karen em Moonlight and Hares (sobre a sua pintura e a natureza), The Graphics Fairy (sobre ilustrações antigas), Rosa Pomar em A Ervilha Cor de Rosa (sobre costura, malhas e artesanato), Casinha de Trapos (trabalhos de costura e artesanato), Bolitos do Oeste (sobre bolos fabulosos), entre muitas outras. A todas um muito obrigada por trazerem mais beleza e sensibilidade, cultura e novos conhecimentos, aos meus (nossos) dias!

quinta-feira, 7 de março de 2013

Para o Dia da Mulher - uma descoberta recente (pelo menos para mim)

Hilma af Klint, Självporträtt (Via Nordic Thoughts).
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Segundo um texto de Álex Vicente, no El País, Hilma af Klint (1862-1944) terá sido a mulher que inventou a abstracção. Resumindo esse artigo, a pintora sueca antecipou-se a Mondrian e a Kandinsky na ruptura com a linguagem figurativa. Gaanhava a vida a vender pinturas de paisagem e realizando desenhos anatómicos para um instituto veterinário. Em privado experimentava outro tipo de pintura inspirada nas forças ocultas, pois era uma aficcionada do espiritismo e da teosofia. No Moderna Museet de Estocolmo faz-se agora uma exposição retrospectiva da sua obra (que termina a 26 de Maio). A história de Hilma af Klint esteve na obscuridade em parte devido à vontade da própria artista, que nunca expôs os quadros abstractos e, antes de morrer (em 1944), pediu que só fossem expostos passados pelo menos vinte anos sobre a sua morte. Somente em 1986, em Los Angeles, foram apresentados pela primeira vez alguns dos seus quadros. Contudo, o seu legado só foi bem conhecido quando o director do museu sueco, Daniel Birnbaum, recebeu uma caixa vinda da ilha de Skeppsholmen, recheada de óleos e aguarelas, estudos e diagramas. Agora que a sua obra foi descoberta, é relevante notar que ela demonstra que as mulheres artistas, do final do século XIX e início do XX, foram capazes de abrir novos caminhos para a pintura (nas palavras de Müller-Westermann, comissária da exposição).

(Link)
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Evidentemente, que em Portugal a situação era diferente nessa mesma época, por muitas razões que agora não iremos desenvolver. Contudo, não se deverá esquecer o valor e a modernidade de artistas como, por exemplo, Aurélia de Sousa (1867-1922). Acrescente-se que vai agora ser publicado um livro pela Editora Esfera do Caos, intitulado «Mulheres Pintoras em Portugal: De Josefa d’Óbidos a Paula Rego», coordenado por Raquel Henriques da Silva, da Universidade Nova de Lisboa, e Sandra Leandro, da Universidade de Évora. As pintoras analisadas e retratadas neste livro são Josefa d’Óbidos, Joana do Salitre, Josefa Greno, Aurélia de Sousa, Mily Possoz, Sarah Affonso, Vieira da Silva, Graça Morais, Ilda DavId', Ana Vidigal e Paula Rego.

quarta-feira, 6 de março de 2013

Os Museus e as suas Colecções

Museu de História Natural, Londres (Link)
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«Uma colecção é um jogo, depende das cartas que se tem».
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Marina Pugliese,
Conferência «Documentação, Museus e História», Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa, 1 de Outubro 2012.
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Um tema que me interessa. Primeiro, julgo que esta frase poderá ser aplicada a todas as escolhas que fazemos na vida. Segundo, aplicando-a à museologia, sobre a qual ela foi dita: será um jogo simples? Creio que não. Ao longo do tempo, tenho ouvido protestos sobre o facto do Museu do Chiado (MNAC) não ter à vista uma colecção permanente. Sempre hesitei na resposta a esta questão, até porque sei bem que não é fácil de resolver. De qualquer modo, desde 21 de Fevereiro que ela lá está, cobrindo os anos de 1850 a 1975. Ainda não a vi, mas gostava de ver - assim como a exposição (certamente diferente) 360º Ciência Descoberta, na Gulbenkian - que trata outro tema que também gosto: a história da ciência.

terça-feira, 5 de março de 2013

Património


 




(Monserrate, 2012)
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«O património é um esteio das sociedades, é a sua memória colectiva, objecto de referência que confere prestígio porque preserva o passado, assegurando aos grupos sociais a sua continuidade temporal».
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Lúcia Maria Cardoso Rosas (1995), in Monumentos Pátrios, A Arquitectura Religiosa Medieval – Património e Restauro (1835-1928), Porto, p. 34.